Lucia Rodrigues, SRC
Você já ouviu falar numa criatura legendária chamada “Minotauro”? Trata-se de um ser mitológico que remonta à tradição grega. Acreditava-se que ele tinha cabeça de touro e corpo de homem e era filho de uma humana com um boi sagrado conhecido como o “Touro de Creta”. Contudo, podemos encontrar também outras representações em que ele é apresentado simplesmente como parte touro, parte humano. Era uma criatura terrível, assassina e descontrolada. Assim, o rei Minos o prendeu em um labirinto para que lá ficasse enclausurado e não oferecesse perigo a ninguém. Contudo, uma vez por ano, o rei era obrigado a colocar no labirinto jovens para serem sacrificados. Eles ficavam tentando fugir do Minotauro dentro dos becos sem saída do labirinto. Em vão, uma vez que terminavam sempre sendo encontrados e devorados pelo animal.

Mas afinal, o que representa essa criatura tão amedrontadora que vive “zanzando” no imaginário do ser humano? O que faz dele um ser que chama tanto nossa atenção?

Primeiro de tudo, é preciso lembrar que ele é de natureza humana. Assim, ele representa uma parte que habita todos os homens e mulheres viventes. Cada um de nós possui um Minotauro dentro de si que, assim como o mitológico, foi colocado dentro do labirinto para ser controlado. Nós igualmente precisamos encontrar formas de controlar aquele que habita dentro de nós. Estamos falando de nossos instintos, nossas vontades egoísticas, nossos desejos de curto prazo etc. Trata-se de todo comportamento impulsivo levado a cabo sem se analisar as consequências. Sabe aquelas horas em que a gente primeiro faz e depois pensa sobre o que fez? Muitas vezes nos arrependemos do que foi feito, mas não temos como voltar para trás. Nesse momento, quem mandou em nossa decisão foi nosso Minotauro. Por isso, há a necessidade de controlá-lo e primeiro pensar para depois fazer.

O labirinto é símbolo dessa necessidade de controlar o Minotauro, mas também representa a dificuldade que a própria vida nos impõe no seu decorrer. Ela é cheia de becos sem saída, bifurcações à direita e à esquerda (e cabe a nós tomar a decisão sobre qual direção tomar), armadilhas e muros com passagens secretas a serem decifradas com sabedoria e inteligência. Em outras palavras, o controle daquilo que existe de “mais selvagem” dentro de nós – nossos impulsos e nossas ações sem pensar – acontece no labirinto da vida. Isso torna nossa aventura com o Minotauro ainda mais desafiante e cheia de mistérios.

Na saga de Harry Potter ele também precisa enfrentar um labirinto. É o terceiro desafio para conquistar a Taça Tribuxo. A tarefa é justamente encontrar a taça no centro do labirinto antes dos demais. Como na viagem da vida, há momentos em que as paredes parecem se fechar: temos a impressão de que não há saída para situações difíceis, quando inesperadamente uma passagem se abre. Assim como no labirinto de Hogwards, há momentos em que precisamos contar com a ajuda de nossos amigos. Em outros momentos, temos o dever de ajudar aqueles que precisam, independente de nossos objetivos pessoais e de nossos desejos.
Na mitologia grega, o Minotauro é derrotado pelo herói Teseu, que como bom guerreiro que era teve a coragem necessária de ir ao encontro da criatura que todos querem esquecer lá no meio do labirinto, como se ela nem sequer existisse. Todos nós gostaríamos de nos esquecer das coisas erradas que fazemos de vez em quando, das situações em que agimos pelos impulsos e de quando não conseguimos ouvir o que há de mais nobre dentro de nós. Já Teseu fez o contrário – ele foi enfrentar o monstro cara a cara com o objetivo forte de derrotá-lo. Ele sabia que um bom guerreiro, assim como um bom cavaleiro, não pode ser guiado pelo seu lado animal, mas pelo seu lado divino expressado nos seus méritos e nas suas virtudes – no bom caráter, no bom comportamento e na boa fé.

Apesar de toda sua bravura, Teseu era humilde e sabia claramente que não seria fácil derrotar uma criatura tão poderosa quanto o Minotauro, especialmente pelas dificuldades impostas pelo próprio labirinto onde a fera estava confinada. Então, ele pediu ajuda para sua amada, a princesa Ariadne. Ela usou de toda a sua intuição e conseguiu vislumbrar um instrumento que salvaria seu querido Teseu. Ela lhe entregou um novelo de lã dourado. Ele desceu ao labirinto segurando a ponta do fio. Com isso, o fio foi desenhando o caminho de Teseu, evitando que ele ficasse andando em círculos ou pegasse duas ou três vezes entradas erradas. Quando finalmente encontrou e derrotou o Minotauro, bastou seguir o fio de Ariadne de volta para sair salvo e em segurança do terrível labirinto.

O fio de Ariadne ficou muito famoso como parte importante dessa lenda e representa a Luz Divina, a sabedoria dos Mestres, que deve ser o guia de nossas vidas. Ela não vai nos dizer para onde temos que ir. Isso cabe a cada um de nós decidir, experimentando todas as alternativas que o labirinto da vida nos apresenta. Mas essa sabedoria, fruto de nosso contato com a voz de nossa consciência, nosso Mestre Interior, fará com que evitemos caminhos que já se mostraram ruins, nos permitindo aprender com nossos próprias erros e experiências e evitando que fiquemos sem rumo na vida, andando em círculos.

Na Ordem Guias do Graal, esse fio é, muitas vezes, nosso próprio Códex – o Código de nossa Cavalaria. Ele nos dá diversas diretrizes que devemos seguir como indicadores dessa sabedoria. Uma dessas diretrizes de conduta nos diz justamente que devemos buscar a companhia de homens e mulheres sábios. Assim, ele nos exorta a estar sempre atentos e nos conectar com coisas e pessoas que sirvam de respaldo e que representem sabedoria em nossas vidas. A sabedoria não é meramente a inteligência, mas sim a capacidade de usar nossa inteligência em nossa vida diária para que possamos sempre primeiro pensar e depois agir. Dessa maneira, atuaremos no mundo com a honra e a dignidade de um cavaleiro, de um místico, de um verdadeiro herói dos tempos atuais. Isso trará felicidade tanto para nós mesmos quanto para todos os que amamos, bem como para todos os demais.
Diferentemente da mitologia, o Minotauro simbólico que habita na humanidade ainda vive e a jornada de Teseu é a jornada que todos os seres humanos estão realizando. Os cavaleiros da Ordem Guias do Graal dão muita importância para essa missão. Devemos estar sempre unidos ao fio de Ariadne e rever nossas vidas diariamente, a fim de aprendermos com nossos acertos e nossos erros. Dessa forma, conseguiremos sempre avançar rumo à nossa evolução pessoal e ao nosso desenvolvimento espiritual.

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